terça-feira, 10 de maio de 2011

Tropicalismo e o movimento modernista no Brasil

O cenário histórico em 1964 se apresentava de forma conturbada, o 
presidente João Goulart propôs uma série de reformas de base, na tentativa 
de reverter o grave problema da desigualdade social no Brasil. Esta visão se 
chocou a da direita, que propunha uma modernização conservadora. Com a 
participação do Congresso, das classes média e alta, essa facção venceu, com 
a deposição do presidente e a tomada do poder pelos militares. O golpe foi 
apoiado pelos americanos e rompeu o regime da época, a democracia. A 
burguesia manteve a concentração de renda e promoveu a expansão capitalista. 
O general Castelo Branco se tornou o primeiro de uma série de presidentes 
da ditadura e seu substituto foi Costa e Silva, que governou o país de 1967 
a 1969 com mais poder ainda.
 
Também no terreno político, 1968 foi o ano em que as tensões chegaram ao 
máximo, com as greves operárias e as manifestações estudantis. Em 
consequência as repressões policiais se intensificaram e as guerrilhas rural 
e urbana aumentaram suas ações, com o crescimento da oposição, Costa e 
Silva, pressionado pela extrema direita, respondeu com o endurecimento 
político. Em dezembro, o Ato Institucional nº 5 decretou o fim das 
liberdades civis e de expressão, sacramentando a censura.
 
Já no cenário cultural, o pais passava por uma revolução. Haviam intensas 
produções de teatro, canções de protesto e as músicas da jovem guarda. Em 
todas as áreas mantinha-se acesa uma polêmica que propunha experimentalismo 
e engajamento, participação e alienação. Em 1968 as controvérsias tomaram 
grandes proporções. No campo da música, houveram confrontos entre os 
artistas nacionalistas de esquerda e os vanguardistas do Tropicalismo. Estes 
se exprimiram contra o autoritarismo e a desigualdade. Mas propuseram a 
internacionalização da cultura e uma nova expressão do pais. 

Grande parte das idéias do movimento tropicalista possui algum tipo de 
relação com as propostas utilizadas durante as décadas de 1920 e 1930, dos 
artistas ligados ao “Movimento antropofágico”, como Mário de Andrade, 
Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, entre outros, são especialmente 
coincidentes as propostas de digerir a cultura exportada pelas potências 
culturais, como a Europa e os EUA, e “regurgitá-la” após ela ser mesclada 
com a cultura popular brasileira e as identidades nacionais. Em ambas as 
propostas havia a intenção de definir a cultura nacional como algo 
heterogêneo e repleto de diversidade, porém em ambos os movimentos esta 
identidade é marcada por uma não identidade, mas ainda assim bastante rica.
A grande diferença entre as duas propostas (a antropofágica e a 
tropicalista) é que a primeira estava interessada na digestão da cultura 
erudita que estava sendo exportada, enquanto os tropicalistas incorporavam 
todo tipo de referencial estético, seja erudito ou popular. E estes 
introduzem uma questão nova, a cultura não necessariamente popular, mas 
“pop”. O movimento, neste sentido, foi bastante influenciado pela estética 
da pop art e reflete todo tipo de criação cultural, independente de classe 
social e opção política.
Ainda que tenha sido bastante influenciado por movimentos artísticos que 
costuma estar associados à idéia de vanguarda negativa, o Tropicalismo 
também manifestou-se como um desdobramento do Concretismo da década de 1950 
(especialmente da Poesia concreta). A preocupação dos tropicalistas em 
tratar a poesia de suas canções como elemento plástico, criando jogos 
linguísticos e brincadeiras com as palavras é um reflexo do Concretismo.
 
Durante a década de 1960, delinearam-se na música popular brasileira três 
grandes tendências: a primeira era composta por artistas que herdaram a 
experiência da Bossa Nova (ou seus próprios representantes), e compunham uma 
música que possuía relações com o samba e o jazz (grupo no qual pode-se 
inserir a figura de Chico Buarque); um segundo grupo reunido sob o título 
"Canção de Protesto", que em geral estava pouco interessado em discutir a 
música propriamente dita mas fazer da canção um instrumento de crítica 
política e social (neste grupo destaca-se a figura de Geraldo Vandré); e 
finalmente havia um terceiro grupo, especialmente dedicado a promover 
experimentações e inovações estéticas na música formado justamente pelos 
artistas tropicalistas.
Baseados no Concretismo e também no atual universo pop, com o 
psicodelismo morrendo e novas tendências surgindo, um grupo de cineastas, 
jornalistas, músicos e intelectuais resolveu fundar um movimento brasileiro 
mas com possibilidades de se transformar em escala mundial: o Tropicalismo.
 
Segundo Oswald de Andrade a filosofia Tropicalista se reflete em 
algumas das frases da época; "Diga-me com quem andas e te direi quem és." 
"Eu sou um homem que trabalha há dez anos e nunca tirou férias." "Graças a 
Deus não devo nada a ninguém e na minha casa não falta nada."
 
Essas e muitas outras frases do gênero, além de quase todos os 
provérbios da língua portuguesa, formarão a linha mestra da filosofia de 
vida tropicalista. Dia das mães, reveillon e Natal são festividades da maior 
importância porque o Tropicalismo exige eventos e efemérides. As 
comemorações serão feitas ao ar livre, em contato com a Natureza, em 
infindáveis piqueniques onde estarão sempre presentes laranjas, bananas, 
fritadas de vagem e garrafas de guaraná com leite dentro, rolhas de papel de 
pão. Abaixo os jantares e coquetéis.
 
No contexto nacional, o Tropicalismo se beneficiou de contatos com outras 
áreas artísticas, notadamente com importantes trabalhos de vanguarda. Como o 
filme Terra em Transe, de Glauber Rocha, e a peça O Rei da Vela, montada por 
José Celso Martinez Corrêa. Como a instalação Tropicália, do artista visual 
neoconcretista Hélio Oiticica, que lhe emprestou o nome. A poesia concreta 
dos irmãos Augusto de Campos e Haroldo de Campos e Décio Pignatari, que o 
apoiaram à primeira hora. A poesia e a filosofia antropofágica do modernista 
Oswald de Andrade (autor de O Rei da Vela), que lhe serviu de inspiração e 
orientação.
 
Entretanto dado o caráter repressivo do período, a intelectualidade da 
época (e principalmente determinadas fatias da juventude universitária 
ligadas ao movimento estudantil) tendiam a rejeitar a proposta tropicalista, 
considerando seus representantes alienados. Apenas décadas mais tarde, 
quando o movimento já havia se esvaziado, ele passou a ser efetivamente 
compreendido e deixou de ser tão menosprezado.
 
Referencia 
 
ANDRADE, Oswald de. O pensamento vivo de Oswald de Andrade. Rio de Janeiro: 
Ediouro, s.d.
 
CALADO, Carlos. Tropicália: a história de uma revolução musical. São Paulo: 
Ed. 34, 1997.

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